Cinismo II
Mas a minha semana desportiva não se ficou por aqui.
Domingo é dia de ir à bola, e para quem vive do outro lado da rua, coisa de uns 10 metros, do portão 5B da entrada no Estádio Cidade de Coimbra, é difícil resistir.
A Académica é a última equipa romântica do nosso futebol, com a excepção do Porto a jogar em casa, nos últimos 3 meses. Chega ao ponto de ainda contar, como aconteceu este fim-de-semana, com dois estudantes que saem do banco quando a equipa não está a conseguir marcar e as estrelas estão ou castigadas ou lesionadas. Aah, é preciso estar lá para perceber o espírito destes jogadores, um tal de Lira e outra chamado Sarmento, um no flanco esquerdo e outro no direito do ataque da Briosa, para perceber que o futebol romântico não pode ganhar, e que isso é tão injusto e ainda doi tanto hoje como nos tempos em que ia com o meu pai...
E, por acaso, eu até ia mesmo. Quando era puto e tinha uns 8 ou 9 anos era sócio do Belém, porque jogava nas escolinhas de futebol, treinado pelo velho Gil, o mítico lateral direito dos magriços que travava sempre sem falta o ímpeto do Rei Pelé na primeira parte do confronto de '66. Nessa altura e mesmo antes, ia sempre ver o Belenenses com o Porto, ao Restelo... e o Porto nunca ganhava. Ali, mesmo no meio daqueles ferrenhos velhos do Belenenses, os sorrisos amarelos que fazia sempre que o Belém marcava e a revolução de emoções que abafava quando o Porto lá conseguia responder, foram algumas das primeiras lições de como o recalcamento pode ser uma coisa saudável e inteligente.
Mas voltando à Briosa, que é, de facto, voltar a esses tempos de emoção genuína.
O jogo era com o Rio Ave e as equipas em confronto eram em tudo diferentes. De uma lado a Académica: uma equipa galvanizada por estar a recuperar na tabela, e já não perder havia 4 jogos, se bem que se tivesse deixado empatar estupidamente nos últimos dois, das duas vezes já nos descontos... exasperante para uma equipa que batalha para sair do último lugar do campeonato. Dominava aquele espírito do "ai... se aqueles 4 pontos não se tivessem perdido... já estávamos acima da linha de água... Desta vez, com os melhores jogadores do meio campo de fora, principalmente sem o Hugo Leal, foi um sempre irregular, complicado e lento Ricardo Fernandes que assumiu o comando da equipa com o enorme Paulo Adriano atrás.
O Rio Ave, para quem não anda a par, é o Rei dos Empates na SuperLiga deste ano. Seria a oportunidade para ver como funciona uma equipa assim, que conseguiu a tranquilidade na tabela empatando, de preferência a zero, em 13 dos 25 jogos que disputou.
É uma máquina de queimar tempo. Aos 43 segundos (segundos!) já tinha um jogador no chão a rebolar-se e a sua dupla de "avançados" não passa de dois jogadores que, para além de serem rápidos, pouco ou nada sabem fazer com uma bola. Para que servem, então, são os principais queimadores de tempo da equipa, se bem que toda a equipa seja uma máquina de enervar o adversário. A um holandês chamado Junas subtrai-se o brasileiro Saulo, com um físico à Liedson, que a cada falta contra pegava na bola do chão e a enviava um pouco mais para trás, argumentando com o árbitro que os academistas, de má-fé, tinham tentado jogar à bola sem perder tempo. O espectáculo Saulo só acabou quando o treinador o tirou do campo e o brasileiro se atirou para o chão, fingindo uma lesão, foi transportado à força por maca, sem assistência médica e, assim que os maqueiros abandoram as 4 linhas, se levantou e começou a caminhar como se nada fosse. Conseguiu, ainda assim, ganhar ainda os 15 segundos que o árbitro demorou a mostrar-lhe o cartão amarelo por insulto à inteligência.
Este Saulo é a face do cinismo do futebol que se está a marimbar para os 10 euros que eu gastei para ir àquele jogo e que teve o mérito insofismável de conseguir a tranquilidade na tabela a umas 10 jornadas do fim. Eu sou dos que pensa que este Saulo está a ocupar o lugar um outro qualquer jovem, que pode até ser brasileiro, ou português, ou holandês ou chinês, mas que é empenhado, talentoso e ambicioso e que, por isso, não tem lugar no Rio Ave.
Eu sou dos que pensa que o problema pode começar a ser resolvido se os jogos 0-0 começarem a contar 0 pontos para o campeonato e que uma equipa que não marca, não quer marcar e não deixa marcar é injustamente beneficiada se conseguir os seus objectivos.
As equipas pequenas podem jogar em contra-ataque, não há mal nenhum nisso, desde que seja com o objectivo de marcar 4 golos no Dragão (ou na Luz, da próxima, se pudesse ser).
Há muitos jogos bons que acabam com 0-0? Eu sei, mas estou convencido que há muitíssimos mais que são maus e que matam o romantismo deste jogo espectacular.
Miguel Maia
Domingo é dia de ir à bola, e para quem vive do outro lado da rua, coisa de uns 10 metros, do portão 5B da entrada no Estádio Cidade de Coimbra, é difícil resistir.
A Académica é a última equipa romântica do nosso futebol, com a excepção do Porto a jogar em casa, nos últimos 3 meses. Chega ao ponto de ainda contar, como aconteceu este fim-de-semana, com dois estudantes que saem do banco quando a equipa não está a conseguir marcar e as estrelas estão ou castigadas ou lesionadas. Aah, é preciso estar lá para perceber o espírito destes jogadores, um tal de Lira e outra chamado Sarmento, um no flanco esquerdo e outro no direito do ataque da Briosa, para perceber que o futebol romântico não pode ganhar, e que isso é tão injusto e ainda doi tanto hoje como nos tempos em que ia com o meu pai...
E, por acaso, eu até ia mesmo. Quando era puto e tinha uns 8 ou 9 anos era sócio do Belém, porque jogava nas escolinhas de futebol, treinado pelo velho Gil, o mítico lateral direito dos magriços que travava sempre sem falta o ímpeto do Rei Pelé na primeira parte do confronto de '66. Nessa altura e mesmo antes, ia sempre ver o Belenenses com o Porto, ao Restelo... e o Porto nunca ganhava. Ali, mesmo no meio daqueles ferrenhos velhos do Belenenses, os sorrisos amarelos que fazia sempre que o Belém marcava e a revolução de emoções que abafava quando o Porto lá conseguia responder, foram algumas das primeiras lições de como o recalcamento pode ser uma coisa saudável e inteligente.
Mas voltando à Briosa, que é, de facto, voltar a esses tempos de emoção genuína.
O jogo era com o Rio Ave e as equipas em confronto eram em tudo diferentes. De uma lado a Académica: uma equipa galvanizada por estar a recuperar na tabela, e já não perder havia 4 jogos, se bem que se tivesse deixado empatar estupidamente nos últimos dois, das duas vezes já nos descontos... exasperante para uma equipa que batalha para sair do último lugar do campeonato. Dominava aquele espírito do "ai... se aqueles 4 pontos não se tivessem perdido... já estávamos acima da linha de água... Desta vez, com os melhores jogadores do meio campo de fora, principalmente sem o Hugo Leal, foi um sempre irregular, complicado e lento Ricardo Fernandes que assumiu o comando da equipa com o enorme Paulo Adriano atrás.
O Rio Ave, para quem não anda a par, é o Rei dos Empates na SuperLiga deste ano. Seria a oportunidade para ver como funciona uma equipa assim, que conseguiu a tranquilidade na tabela empatando, de preferência a zero, em 13 dos 25 jogos que disputou.
É uma máquina de queimar tempo. Aos 43 segundos (segundos!) já tinha um jogador no chão a rebolar-se e a sua dupla de "avançados" não passa de dois jogadores que, para além de serem rápidos, pouco ou nada sabem fazer com uma bola. Para que servem, então, são os principais queimadores de tempo da equipa, se bem que toda a equipa seja uma máquina de enervar o adversário. A um holandês chamado Junas subtrai-se o brasileiro Saulo, com um físico à Liedson, que a cada falta contra pegava na bola do chão e a enviava um pouco mais para trás, argumentando com o árbitro que os academistas, de má-fé, tinham tentado jogar à bola sem perder tempo. O espectáculo Saulo só acabou quando o treinador o tirou do campo e o brasileiro se atirou para o chão, fingindo uma lesão, foi transportado à força por maca, sem assistência médica e, assim que os maqueiros abandoram as 4 linhas, se levantou e começou a caminhar como se nada fosse. Conseguiu, ainda assim, ganhar ainda os 15 segundos que o árbitro demorou a mostrar-lhe o cartão amarelo por insulto à inteligência.
Este Saulo é a face do cinismo do futebol que se está a marimbar para os 10 euros que eu gastei para ir àquele jogo e que teve o mérito insofismável de conseguir a tranquilidade na tabela a umas 10 jornadas do fim. Eu sou dos que pensa que este Saulo está a ocupar o lugar um outro qualquer jovem, que pode até ser brasileiro, ou português, ou holandês ou chinês, mas que é empenhado, talentoso e ambicioso e que, por isso, não tem lugar no Rio Ave.
Eu sou dos que pensa que o problema pode começar a ser resolvido se os jogos 0-0 começarem a contar 0 pontos para o campeonato e que uma equipa que não marca, não quer marcar e não deixa marcar é injustamente beneficiada se conseguir os seus objectivos.
As equipas pequenas podem jogar em contra-ataque, não há mal nenhum nisso, desde que seja com o objectivo de marcar 4 golos no Dragão (ou na Luz, da próxima, se pudesse ser).
Há muitos jogos bons que acabam com 0-0? Eu sei, mas estou convencido que há muitíssimos mais que são maus e que matam o romantismo deste jogo espectacular.
Miguel Maia
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