quarta-feira, outubro 29

Associações

Não é novidade nenhuma que uma das tácticas políticas mais usadas contra adversários é o da acusação por associação. E não se limita à política interna. Os presidentes Bush justificaram repetidamente as suas acções contra Saddam Hussein associando-o aos nazis e, mais tarde, a Al-Qaeda, com o mesmo grau zero de ligação existindo entre o ditador iraquiano e qualquer um dos movimentos.

Essa táctica também já não é novidade na campanha contra Barack Obama. Primeiro foi a associação aos actos terroristas de Bill Ayers, que fez do afro-americano com um nome parecido com Ossama, nada menos que um terrorista islâmico in the closet.

Mas agora a táctica da associação entrou num campo ideológico de longe mais interessante que os anteriores. Em resposta a um suposto canalizador chamado Joe que dizia ir ter pagar mais impostos sob a administração Obama, o candidato democrata disse que é melhor "espalhar a riqueza". Bem sei que para o comum dos europeus, que vive sob a protecção de um welfare state que não vai a lado nenhum, nada pareceria mais óbvio. Mas a América é fundado sob o signo do negócio e da realização individual que gera riqueza individual.

É claro que os republicanos pegaram na frase "espalhar a riqueza" e a repetiram à exaustão. Não contentes com os jogos de associação anteriores, decidiram que era tempo de transformar Obama num terrorista islâmico... e comunista, um homem que acredita num dos dogmas básicos do socialista. E se pensam que a associação é difícil, não menosprezem a capacidade dessa parte do eleitorado de todos os países (nós também os temos) que precisa de seja do que for para viver mais confortavelmente.

Ainda assim, trata-se, como não podia deixar de ser, de uma associação. Um tipo de associação em que se toma a parte pelo todo, algo que em retórica se chama uma "falácia de divisão". O que Obama propõe é a subida dos impostos e posterior redistribuição de parta da riqueza dos 5% mais ricos do seu país. O que o socialismo propõe é a redistribuição de toda a riqueza de todos os habitantes do país. O que Obama propõe é uma instância de justiça social baseada numa concepção da riqueza que a coloca ao serviço dos mais desventurosos (um conceito bem cristão, por sinal). O que o socialismo propõe é a abolição da propriedade privada.

O que Obama propõe não é o socialismo. É aquela parte do socialismo que a teoria liberal mais moderada adoptou, mesmo em países como os Estados Unidos (sim, mesmo lá o imposto sobre o rendimento já existe há muito tempo). O que ele propõe é uma medida de equidade e solidariedade social que não coloca em causa a estabilidade da economia (taxar 20% dos rendimentos, o máximo que Obama propõe para os mais ricos dos mais ricos, não chega nem perto dos mais de 50% que se taxa na Bélgica ou na Itália). Não é socialismo, é social democracia, é democrata. Eis uma associação em que se devia insistir.