segunda-feira, novembro 20

Haja paciência

O Senador McCain, o famoso maverick, já veio dizer que o fundamentalismo do rev. Falwell não é assim tão fundamentalista. Em breve, se isso lhe servir para ganhar, ainda vai entrar na realidade paralela dos que dizem que Iraque vai andando, muito obrigado.

A solução, como resulta óbvio dos exemplos passados, não é colocar mais militares no terreno. Retirar, pura e simplesmente, nesta altura, seria sempre desastroso. Mas não nos devemos concentrar na solução militar deste problema. Devemos fazer com que a solução política avance rapidamente e fazer um draft na América (não vejo outra solução mágica para desencantar 350 000 homens armados) é totalmente de evitar. Para além do mais, como já se provou em n situações, despejar militares é um paleativo, para além dos mais corrosivo numa sociedade já de si distanciada dos políticos e tendencialmente violenta. Fala-se tanto do Vietname; alguém acha que o Vietname se perdeu por falta de tropas no terreno?

Enxarcar o terreno de militares é cometer o mesmo erro de há 3 anos, de achar que se pode fazer copy/paste da paz e da segurança. O único meio militar de se atingir a paz num país crivado de guerrilhas é pela opressão, pela tortura, pela violação dos direitos humanos e pelo terror. É isso que é suposto estarmos a combater.

O único meio moral é pelos famosos hearts and minds (quem diria que estaria para aqui a citar a Secr. Rice a uma hora destas).

Eu compreendo a sedução que os militares causam a quem nunca se veria num campo de batalha, mas vão por mim: soldados são e serão assassinos a soldo, que mancham de sangue tudo quanto tocam.
É preciso começar por encontrar uma solução política para a realidade iraquiana.

E é penoso que, depois de 3 anos (desta vez não me enganei) de invasão se tenha chegado à conclusão que é preciso saber o que fazer do Iraque: se um sistema federal forte, se um sistema federal fraco.
A mim parece que o sistema federal deve conceder o máximo de poderes às autoridades locais e que o poder militar central deve servir apenas para controlar os ensejos expansionistas de cada uma das regiões. Saddam conseguia-o pelo medo, mas pensar que só assim é que é possível é desconsiderar um povo que também tem o direito à paz e à liberdade.

Mas, como em tudo o resto, a direita tenta resolver o problema "amanhã", com soluções "imediatas", em vez de ver o longo prazo. E não vale a pena vir com pele de cordeiro dizer que "não se concordou com o método", quando depois se diz que "o Iraque está melhor sem Saddam". Este Iraque não melhorou em nada exactamente porque o método foi o mesmo. Se o objectivo da Al-Qaeda era fazer o Ocidente regredir até antes da Idade Média, a revogação do habeas corpus para não-cidadãos americanos foi uma clamorosa vitória da Al Qaeda. As própria eleições iraquianas, como todas as outras oportunidades históricas perdidas por esta administração, foram eivadas de fraude e estes governantes são pouco mais legítimos que o "Saddam dos 96%".
Para além disso, ironia das ironias, as primeiras armas de destruição massiça a serem encotradas no Iraque desde o início dos anos 90 vieram pela mão americana, mas desta vez para serem usadas em Fallujah.
Não, este Iraque (que estava péssimo nas mãos de um ditador cruel) não está melhor.

A solução é fazer o mais difícil:
não é só abrir o campo de acção da NATO e das forças Europeias nas missões internacionais;
é impôr limites às emissões de CO2 (linear, como sempre, a direita não vê aqui relação com a "war on terror");

é pugnar pelos objectivos do milénio; eliminar a SIDA, a pobreza, educar os políticos e os torcionários para o respeito dos direitos humanos, educar as crianças todas, no-one left behind..

é mostrar ao Islão que esta é uma guerra corajosa e sem quartel ao fundamentalismo e não ao próprio Islão (convencer os paquistaneses disso é importantíssimo,
mas primeiro é preciso que isso seja verdade).
é mostrar-lhes a nossa determinação em que o 11 de Setembro não se repita, nem aqui nem lá.

é destruir muros e criar pontes, diria alguém europeu.

A via certa, a mesma que até ao ano 2000 tinha consegido reaproximar a China, o Vietname e até a Coreia de Norte ao Ocidente, é a do multilateralismo e da interdependência.

Se a sedução pela solução fácil que os militares sempre apresentaram aos pobres de espírito fosse posta para segundo plano (volto a dizer que não estou a falar de uma retirada, mas de um redireccionamento das prioridades), talvez possamos caminhar para algo de melhor.

Enquanto a direita estiver na Casa Branca, nunca haverá a clarivência para ver isso.

Se mal pergunte,

Com o brilhantismo intelectual que sempre a caracterizou, e a que alguns meses no estrangeiro já me tinham desabituado, dei com esta pérola na respública. É, aliás, sempre bonito de ver o campo que apoiou a invasão mais idiota desde a Baía dos Porcos a falar dos outros, dos que não têm plano para sair da mais previsível das embrulhadas em que se viram metidos. Sim, porque esta embrulhada era tão previsível... tão irritantemente previsível...

Descobriu-se agora, como se os mais pragmáticos de entre os opositores à guerra já não o tivessem feito notar na longínqua Primavera de 2003, que o exército dos Estados Unidos não tem os efectivos suficiente para ser um polícia do mundo. Isto se estivermos a falar do mundo inteirinho meesmo.

Conclusão óbvia: A guerra no Iraque nunca devia ter acontecido.
Quer o primeiro presidente Bush, de que não sou particularmente fã, quer o presidente Clinton deixaram Saddam sem arma de destruiça massiça absolutamente nenhuma e a única maneira, como bem se vê, de levar a bom termo a libertação do Iraque passava por continuar a desgastar o Saddam (que já não conseguia fazer mal ao seu povo) e por fazer a transição para a liberdade através dos movimentos internos do Iraque. Se vai ter que funcionar agora para o Irão e para a Coreia do Norte, porque é que não ia funcionar com o Iraque?

Mas,
se mal pergunte, de onde é que eles vão buscar os 350 mil homens que faltam para ganhar no Iraque? Ao Afeganistão, onde se encontra o verdadeiro perigo terrorista para o Ocidente (e mesmo assim não chegavam)? Ao Pacífico Sul, onde se encontra o verdadeiro perigo nuclear para o Ocidente (e mesmo assim também não chegavam)?
Ou ao México, com mais um promessa de cidadania em forma de caixão (assim, talvez já cheguessem)?
Não me digam que vão procurar o apoio das Nações Unidas...

Também sou contra a retirada do Iraque. Mas a mesma aritmética que confunde os neo-cons serve-me para notar que é óbvio que um exército nacional iraquiano, que consiga sem menos atroz que o que está estacionado no Iraque, demora longos anos a formar.

O que fazer com o entretanto, esse conceito que não entra na cabeça dos neo-cons? Quem se pronunciou a favor da invasão que use o mesmo brilhantismo intelectual para encontrar as saídas. Eu cá tenho as minhas ideias... mas espero para ver.

quarta-feira, novembro 15

Ainda ninguém me tinha avisado... 2

Sempre achei o branquamento da culpa uma arte. Para além de requerer criatividade, requer um grande primor técnico que não está ao alcance de todos.

Dizia o Paulo Portas, ontem, que "já participou em Conselhos de Ministros" e que, "por experiência própria", acha "boa ideia" dar-se uma "atenção especial" aos problemas das alterações climáticas ao nível governamental.

Durante os 3 anos... os 3 longos anos... em que foi "ganhando experiência" em Conselhos de Ministros, ter-lhe-á passado pela cabeça (afinal era o líder do segundo partido de uma coligação do governo) propôr a criação de uma taskforce interministrial, que apresentasse propostas e requeresse resultados ao Conselho? Alguém fez isso?

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Ontem, dizia Paulo Portas que, apesar das evidentes empatias com a actual administração americana, "não concordava" com a vista grossa que a equipa do presidente Bush faz à contribuição das emissões de CO2 para o aquecimento global.

Durante o tempo... esses 3 longos anos... em que a sua participação na arena política fazia política (a expressão made policy funciona melhor em inglês), ter-se-á lembrado de referir que, apesar do apoio à intervenção no Iraque, não apoiava a administração Bush na sua decisão de não ratificar Kyoto? Alguém sabia disso?

Ainda ninguém me tinha avisado...

... que a campanha para as presidenciais 2016 já tinha começado.

Foi preciso eu ver o Paulo Portas (vou aproveitar para o chamar simplesmente "Paulo Portas", enquanto não for obrigado pelo hype, a miopia histórica e a estupidez a chamá-lo o "saudoso Paulo Portas") a falar de pintores surrealistas para descobrir que a sucessão ao Cavaco já está a ser discutida.

terça-feira, novembro 14

Para Todos os Gostos

Junto à lista de blogs a ver mais duas revelações na blogosfera:

Aqui o futebol é visto à lupa - e não é metáfora, que ainda hei-de ver uma análise sobre o pedaço de fita-cola com que os atacadores são rematados.

Aqui, os relatórios - sobre tudo e quase nada - de voo de um tapete que se prepara para ir para longe.

Bem-vindo

Por falar nisso,
Ouvi o jl dizer-me de viva voz, um dia destes, que achava idiota ver as eleições americanas como um referendo ao Iraque.

Eu não definiria a comparação propriamente de idiota, se bem que concorde que, numa democracia com mandatos de 4 anos e coisas desse género, o julgamento das políticas de um presidente se faz nas eleições presidenciais e as de um congressista nas eleições intercalares.

Sem querer cair na desonestidade intelectual, mas provavelmente sem a conseguir evitar, o que eu queria realçar é que, nos dias a seguir às eleições que não eram um referendo ao Iraque mas sim a eleição da casa dos representantes e de um terço do senado, e depois de ter ouvido a palavra idiota da voz viva do amigo jl, o dabbia demitiu o secretário da defesa.

Por esta lógica, o jl deverá considerar o presidente dabbia um idiota; uma teoria, aliás, que eu já defendo há anos. É por isso que lhe digo: Bem-vindo ao nosso campo!

É claro que o presidente já saiu a terreiro a explicar que já tinha tomado a decisão de demitir o secretário Rumsfeld antes e que só a dissera há dois dias que não o ia demitir porque acha que mentir numa campanha eleitoral lhe vai dar mais daqueles votos dos valores morais.

Provavelmente tem razão. O presidente que não trouxe Bin Laden à justiça, que entrou no Iraque por causa de um perigo terrível que nunca existiu e que reinstaurou a tortura contra prisioneiro despindo-lhes da sua nacionalidade (os combatentes com nacionalidade não podem ser torturados à luz da Convenção de Genebra) não precisa da verdade para fazer sentido. The truth, já dizia o outro, has a liberal bias.

A verdade do dabbia já completou o ciclo. A América dos pesadelos de Orwell já pode voltar dormir descansada. A máquina discursiva do partido Republicano já arranjou maneira de tudo voltar a fazer sentido. Ele mentiu porque, e passo a citar, "não ia estar a dizer a verdade a dois dias das eleições".
Just turn on your 24/7 worth of Fox News and go back to bed, America.

segunda-feira, novembro 13

Intercalar

Quer dizer que as eleições intercalares na América foram um referendo ao Iraque, está a fazer um grandíssimo favor ao povo que re-elegeu o prior presidente da história do seu país.

Não hajam ilusões. Os americanos, que não se preocuparam antes com a maneira ilegal e imoral como se atacou o Iraque, agora estão contra a Guerra porque, para além de imoral e ilegal, também foi estúpida e ineficaz (como quase todas as coisas imorais, e muitas das ilegais). Se o presidente Bush tivesse conseguido resultados, os meios tinham sido prontamente esquecidos.

Por isso, se as eleições foram influenciadas pelo Iraque (e não nos esqueçamos desse pequeno factor que é a escolha de um senador ou de um congressista pelo que ele vale), não o foram porque os americanos estão a despertar para a consciência do que permitiram que se fizesse no Iraque, mas apenas porque não funcionou.

quarta-feira, novembro 8

Caro Sr. Bush (o filho)

Um conselho amigo:

However beautiful the strategy, you should occasionally look at the results.

Winston Churchill.

Back to reality

Assim como quem recalca qualquer coisa de muito negativo, já me tinha esquecido que a Judite de Sousa existia. Isto até a ver entrevistar o António Vitorino na segunda-feira à noite...

Estavam a falar de alterações climáticas. Aliás, o pequeno timoneiro do PS estava a falar de alterações climáticas e nem estava a falar de coisas muito técnicas como termo-valorizadores, carvão limpo, ou offset das nossas emissões de CO2 para os países em desenvolvimento... não, não estava a elevar a discussão ao ponto em que realmente se pode discutir qualquer coisa.

Mas a Judite consegue sempre arrasar mesmo o que já está a voar baixinho e enterrá-lo 1.50 m debaixo do chão. E aquele era o momento por que ela esparava há anos: a oportunidade de poder falar do tempo que faz e que está muito instável, em directo na televisão.

Assim que ela abriu a boca para interromper o Vitorino e disse alegremente: "Pois é! Já estamos em Novembro e ainda nem vestimos os nossos casacos mais pesados, não é?", as minhas expectativas para os próximos três meses foram completamente devastadas.